quarta-feira, 9 de novembro de 2011

INTERNACIONAIS 4 - O CINEMA REMIXADO

Beatriz Braga

Em tempos de correria, a arte pode ser flagrante. As câmeras captam o passar do tempo, a perda da espontaneidade. O cinema em remix, repetindo o que todo mundo vê sempre mas não reflete, tem um propósito. Para reproduzir o ciclo vicioso da modernidade, da rotina e de um passado ainda presente, o cinema fala, repete e repete de novo. As cenas dos curtas de sessão Cinema Remixado ficaram como um mantra na cabeça dos telespectadores. A receita, porém, corre o risco de parecer um disco emperrado e não agradar. A ordem é prestar atenção nas imagens, esquecer as falas, diálogos e afins. O que importa está no movimento e na sucessão problemática dos acontecimentos.

O homem musculoso que malha incansavelmente, as crianças que brincam no aparelho eletrônico, um motorista de tanque de guerra que dorme ao volante e o casal gay que disputa uma competição de dança. O curta Joule (David Zamagni e Nadia Ranocchi, Itália) apresenta a mecanicidade da rotina. O hábito ganha a indiferença de uma stripper apática. A vida fica essencialmente pornográfica como a dançarina de corpo dançante e sensual, mas de olhos estáticos, cansados, prostituídos. Partindo para o macro, o filme The Voice of God (Bernd Lutzeler, India) fala também da rotina. Mas agora sobre o dia a dia de Mumbai, narrado por uma voz forte, com uma pretensão divina, sem legendas para o português. As cenas mostram pássaros presos entre cercos de concreto, carros em movimentos, rastros de pessoas deixados nas ruas. Uma mulher indiana aparece, reclusa e triste em seu quarto, entre os flashes tumultuados. Uma representação da figura feminina, esquecida entre o crescimento econômico da cidade.

">“Você é um homem bom" tenta, incansavelmente, se fazer crível a mãe de um ex-soldado. I´m Not the Enemy (Bjorn Melhus, Alemanha) é uma reflexão cômica sobre a insuficiência de um país e da própria família em lidar com o pós-guerra. O rapaz, depressivo, deitado no sofá, divaga sobre o que é vida e morte, enquanto seus pais parecem querer disfarçar suas próprias dores e repetem clichês. O Rádio, à sua moda antiga, aparece constantemente nas cenas e simbolicamente traz a presença histórica e o peso do país em uma casa de família comum. A criança feliz que um dia foi o homem, marcado agora pela guerra, está morta e tudo está acabado.

Conference (Nobert Paffenbichler, Austria) traz também a guerra, agora numa retrospectiva de vários atores interpretando Hitler em preto e branco. Mudam os rostos e cenários, continuam as expressões ásperas. Entre dizeres inteligíveis, a brutalidade incomoda o telespectador. A Alemanha da década de 1940 está volta e é impossível entender a popularidade e a submissão de um povo por aquele som remixado da ditadura.

O sexto filme da sessão, Stardust (Nicolas Provost, Bélgica), é uma trama que ganha vida na noite de Las Vegas. Uma câmera escondida e um suspense entre as casas de jogos da cidade. A edição perturbadora do filme, os diálogos praticamente incompreensíveis e o roteiro cansativo chegam a causar, em alguns momentos, desconforto no telespectador.

Um comentário:

  1. Muito bom, Bia! Gostei especialmente da tua análise da stripper, do seu olhar estático.

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