quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Brasil 5 - Imagens do Futuro


André Valença

O Brasil lá de fora e o lá de fora daqui

A provável unidade da seleção de curtas-metragens Brasil 5 (ou Imagens do Futuro) se deu, curioso e paradoxalmente, à sua internacionalização (ou universalização, se convir mais). Infelizmente, apenas quatro filmes e meio foram exibidos na sessão realizada no São Luiz. Enquanto todos os outros filmes tiveram uma projeção bem sucedida, o curta de Antônio Castro, Viagem a Marte (2010), foi interrompido no meio por problemas técnicos. Possivelmente, o filme viria a reforçar uma das melhores seleções brasileiras até agora exibidas.

A sessão começou com o retalhado Pacífico (Jonathas Andrade, 2010). Cenas em stop-motion com modelos de papel revelam formações rochosas sendo formadas (ou deformadas?), rios alterando espaços, ventos soprando sobre o planeta, tudo numa rapidez que deixa na dúvida se se tratam das alterações naturais da Terra em alta velocidade, ou de alguma calamidade natural. Em seguida, passamos os olhos pela história do Chile, os tormentos e êxitos de um país historicamente perturbado. Essas conquistas e retrocessos são o caminho natural da humanidade, ou a intervenção humana compromete um curso mais fluente? "Estamos acostumados ao sismo, mas não ao terremoto", a voz de uma chilena declara em off. Descobrimos através desta e de outras que o filme trata da ressaca do terremoto que ocorreu no Chile. Só do terremoto?

Em seguida, um filme necessário. De Volta ao Quarto 666 (Gustavo Spolidoro, 2010) põe Wim Wenders no quarto onde ele gravou Quarto 666 (1982), documentário onde, cada um por vez, vários diretores de cinema do mundo são postos no tal quarto de hotel, em Cannes, para responder à pergunta: "qual o futuro do cinema?". Algumas respostas "apocalíticas" demonstravam um temor do fim do cinema. Contudo, tais hipóteses se tornaram infundadas, como Wenders tenta explicar, enquanto sobreposições de imagens do filme de 1982 dialogam com seu discurso.

E então, entra mais uma inovação de Gabriel Mascaro. O diretor pernambucano de Um Lugar ao Sol (2009) e Avenida Brasília Formosa (2010) concebeu As Aventuras de Paulo Bruscky (2009) (foto), um filme realizado inteiramente no Second Life, plataforma mundialmente conhecida de relacionamento virtual constituída por avatares dos internautas, que passeiam por uma versão onírica do mundo pragmático. No filme, um "cinegrafista" de eventos do Second Life chamado (também) Gabriel Mascaro e o artista Paulo Bruscky gravam um suposto documentário no jogo. O filme não só está repleto de uma metalinguagem um tanto particular, como também abre as portas para uma concepção muito mais "real" do mundo virtual.

O último filme a ser exibido por completo foi o Haruo Ohara (Rodrigo Grota, 2010). Nada como uma fotografia suave e bem composta – realizada em digital, não se surpreendam! – para fazer jus às fotos tiradas por Haruo Ohara, fotógrafo japonês que morou dezenas de anos numa área rural do Paraná. O filme não se trata, contudo, de um documentário, mas de uma reconstrução com atores dos momentos quando as fotos foram tiradas. A sensibilidade estética e o respeito pelo artista permeiam essa obra deslumbrante.

Um comentário:

  1. Viagem a Marte vale muito a pena de ser assistido: com uma ironia quase Douglas Adams, o cineasta compõe quase um universo paralelo, reescrevendo a História a partir de imagens reais, ressignificando-as a seu favor.

    Gostei muito do que As Aventuras de Paulo Bruscky me fez questionar: o que é um documentário? É a captura de imagens reais? Ou é simplesmente supor algum princípio de verdade naquilo que está sendo mostrado?

    Com "De volta ao quarto 666", pensei no desprendimento de Wim Wenders, quando acho que ele finalmente percebe que o cinema não "pertence" a ele, mas se encontra dentro de todos os que dele participam, independente de lado da tela estejam.

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