sexta-feira, 23 de outubro de 2009

A Solidão dos Corredores de Longa Distância



Por Doralice Amorim

A noite da última quinta-feira (22/10), da Janela, contou com uma seleção de filmes, essencialmente, pessoais. O segundo programa da Mostra Competitiva Brasileira preocupou-se em abordar o tema da solidão. O primeiro filme da sessão, Depois de Tudo (RJ, 2009)- foto , contou com um elenco de destaque. Ney Matogrosso e Nilton Parente formaram o casal que deu vida ao curta. A utilização de grandes celebridades pode, algumas vezes, atrapalhar a composição da história, pois o público atribui valores àqueles personagens que vão além das idéias propostas pelo filme. Para o diretor, Rafael Saar, a presença de Ney Matogrosso, na produção, é bem executada justamente por isso. Ele é um homem que carrega uma grande história e é identificado pelo público, principalmente, o brasileiro, como um símbolo da libertação sexual e a sua atuação só acentuaria a quebra das barreiras propostas pelo filme. É curioso observar também, como o diretor desenvolveu uma história bastante simples, na verdade, um recorte da vida de dois homens de terceira idade durante uma noite, e, em poucos minutos, construiu uma história de amor bela, marcada pela separação e pela espera.

Phiro (SP, 2008) pode ser considerado o grande destaque da sessão. Em 12 minutos, o diretor, Gregório Graziozi, construiu, talvez, o filme mais pessoal do programa ao retratar alguns momentos da vida seu bisavô. Phiro é um filme, essencialmente, sobre a ausência e Gregório consegue desenvolver muito bem essa proposta. Ao longo das gravações, ele mostra o vazio da casa do seu bisavô e o quanto essa ausência parece se encaixar, perfeitamente, com a realidade daquele senhor. A platéia vai conhecendo, aos poucos, os sentimentos de um homem de cem anos e a sua solidão diante da morte da esposa. O interessante é observar que a casa é apresentada, nos seus pequenos detalhes, evidenciando o vazio do personagem, ao mesmo tempo em que, cada objeto e cômodos estão marcados pela presença daquela mulher e pela jornada que eles atravessaram juntos. Com grande afetividade, o diretor compôs uma história sobre o amor e, principalmente, sobre o estar só, mas preocupou-se em valorizar também a importância de todos os anos que os seus bisavôs viveram juntos.

JLG/PG (SP, 2009), foi construído a partir de uma obsessão do diretor pela figura do cineasta Jean-Luc Godard. O filme retrata uma tentativa frustrada do personagem, o próprio diretor Paolo Gregori, em encontrar-se com quem, para ele, seria o grande nome do cinema mundial. O caráter invasivo e pessoal da produção conecta-o com os outros filmes, mas ela é, sem dúvidas, a mais "diferente" do programa. Contudo, tal evidencia não tira o mérito de JLG/PG participar da sessão. Paolo Gregori desenvolveu, de forma bastante inteligente, um filme que o conectou com o seu grande "mestre" não apenas no conteúdo, mas na forma com que ele foi construído. Os letreiros avermelhados que intercalam algumas cenas, assim como a construção de palavras, ("GOD ART", uma brincadeira a partir do nome do cineasta) aproximaram Godard do filme, mesmo contra a sua vontade.

O quarto filme da noite, Flores em vida (SP, 2009) contou com uma personagem encantadora. Lazara Crystal é uma senhora com idade bastante avançada e que ainda trabalha na sua floricultura. Os dois realizadores, Rodrigo Marques e Eduardo Consonni, tiveram a preocupação de trabalhar o cotidiano da personagem à medida que a apresentavam para a platéia. A partir de relatos, Crystal conta fatos da sua vida e fascina os espectadores pela sua desenvoltura e naturalidade. O último filme, Chapa (SP, 2209) retratou mais uma vez, o sentimento de estar só. A espera do personagem à beira de uma estrada contrasta a sua solidão e inércia frente à travessia de várias outras pessoas.

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