sexta-feira, 23 de outubro de 2009

Everests Pessoais

Por João Roberto Cintra

CLIMB EVERY MOUNTAIN...

Dois homens escalam uma montanha. Força física, esforço, pedras. O primeiro filme da sessão Everests Pessoais é quase um prólogo do que vai-se seguir. Histórias de conquista pessoal e superação que felizmente não resvalam em auto-ajuda. Two days (FRA) pode ser ligado inversamente a Houna e Manny (EUA). Enquanto há uma certa disputa entre os dois homens no primeiro – evidente pelo som apenas do fôlego dos dois, nenhuma palavra, nenhum conforto –, o segundo, sobre duas imigrantes nos EEUU, mostra personagens que encontram sintonia nas dificuldades comuns.

A semelhança dos títulos Um dia na sua vida (EUA) e Um dia na vida (Hong Kong) mais do que unir os filmes distancia-os. O primeiro, tendo uma jovem em seu apartamento como personagem, é um exercício egoísta de quem insiste em sofrer apenas para sentir pena de si mesmo: clichês românticos/depressivos, em uma narração quase prescritiva de alguém que gosta de estar na posição de vítima. Diretamente oposta ao dia que representa toda a vida da senhora do filme oriental: fragilizada pela idade, mas sem demonstrar fraqueza, um dia para ela é sempre trabalho duro, mas também a possibilidade de mudança e negação de dificuldades (como a falta de dinheiro e a ausência do filho), além de esperança e ternura com a neta que cuida. Não há tempo aqui para sofrer – e ainda mais lamentar o seu próprio sofrimento.

Não há paralelos tão evidentes, entretanto, para Nora (EUA). Como contar a história de uma bailarina africana que migra e se profissionaliza nos EEUU? A partir desse mote, o filme vira uma explosão sinestésica que parece situar o espectador na definição do cinema como sétima arte: não só a última a ser criada, mas a junção de todas as outras. Cores, sons, dança, tudo apela aos sentidos, sem cair apenas em experimentalismos: a história da bailarina é coerentemente contada a cada grito, pé no barro ou flor amarela que aparece. Tudo faz sentido, e apela aos nossos. Nora, o filme, é acima de tudo um exercício de metalinguagem que define Nora, a pessoa, como sempre foi: protagonista da sua própria história. Não há montanha que não se possa escalar.

Nenhum comentário:

Postar um comentário